A presidência de Javier Milei na Argentina tem gerado reações contraditórias, com elogios internacionais ao controle da inflação, mas também críticas internas devido ao impacto de suas políticas sobre a população mais vulnerável. Em comunidades como Villa Azul, uma das principais favelas da região metropolitana de Buenos Aires, as promessas de recuperação econômica ainda não chegaram.
José Maria, ferreiro de 47 anos, é um exemplo de apoiador de Milei que enfrenta os desafios diários de um sistema econômico em ajuste. Ele acredita na necessidade de mudança, mas questiona quando os benefícios prometidos serão sentidos por famílias como a dele. Em sua casa simples, compartilha mate com a família e relata as dificuldades crescentes.
Villa Azul, conhecida durante a pandemia por ser foco de um surto de Covid-19, é marcada pela falta de saneamento, ruas de terra e condições de vida precárias. O bairro está separado por uma estreita rua de Avellaneda, uma área urbanizada e arborizada, em um contraste que lembra as divisões sociais de grandes cidades brasileiras.
Marcelina Yedro, 68, sogra de José Maria, vive há mais de 40 anos em Villa Azul. Ela descreve um cotidiano de privação agravado pela inflação e pela falta de oportunidades para os jovens. “Antes, com mil pesos, comprávamos gás. Agora, subiu para 10 mil. Chegar ao fim do mês é uma luta diária”, conta.
A redução drástica de investimentos públicos é sentida diretamente na região. As obras foram interrompidas e o setor de construção registrou queda de quase 30% em 2023, comparado ao ano anterior. Segundo Milei, os cortes de despesas públicas, que chegaram a 30%, são essenciais para atrair investimentos e estabilizar salários no longo prazo.
Contudo, especialistas alertam para as consequências sociais. Bárbara Couto, diretora do Instituto do Conurbano da Universidade Nacional de General Sarmiento, afirma que a ausência de um “colchão social” agravou a crise. “O ajuste fiscal afetou uma população já vulnerável, que depende de políticas sociais para sobreviver”, explica.
Enquanto o poder de compra despenca, o consumo segue a mesma tendência. Em outubro de 2023, houve uma retração de 20,4% em comparação ao mesmo período do ano anterior, a maior em uma década.
Apesar disso, Milei mantém um discurso otimista. “Estamos organizando a macroeconomia e isso atrairá investimentos, porque o dinheiro busca ambientes favoráveis para se desenvolver”, declarou recentemente.
Entretanto, figuras como Margarita Barrientos, ativista social e fundadora do refeitório comunitário Los Piletones, sentem o impacto das mudanças. O espaço, que oferece de 2.500 a 3.000 refeições diárias, enfrenta dificuldades financeiras e falta de apoio governamental. “Este é o pior momento em 28 anos de trabalho. Não há comunicação nem ajuda”, lamenta Margarita.
Enquanto o governo aposta na austeridade para alcançar estabilidade econômica, milhões de argentinos aguardam que essas medidas tragam resultados palpáveis para suas vidas. A desigualdade, intensificada pela crise, continua sendo o maior desafio para o país.
(Diário do Centro do Mundo)