Enquanto Jair Bolsonaro mente dizendo que a economia “está bombando”, o percentual de pessoas que vivem em lares sem qualquer renda do trabalho chega ao maior patamar desde 2020. Naquele ano, a pandemia impediu os trabalhadores, principalmente informais, de irem às ruas para garantir o sustento, enquanto o Planalto protelava a adoção do auxílio emergencial. Dois anos depois, os problemas são outros, mas a origem deles ainda é a ação nefasta do desgoverno Bolsonaro.
Um levantamento do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp/Uerj) estima que 38,7 milhões de pessoas vivem em lares sem qualquer renda do trabalho, nem mesmo o informal. Elas representavam 17,9% da população em 2021, o segundo maior patamar já registrado desde 2012, início da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE.
Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística fundamentam o levantamento do sociólogo Rogério Barbosa, para quem “nunca se trabalhou tão pouco assim”. “Isso significa que uma série de pessoas está vivendo exclusivamente de rendas assistenciais, estratégias precárias e previdência de baixa remuneração”, explica Barbosa em reportagem do Jornal O Globo.
Entre as famílias brasileiras, a remuneração do trabalho costuma corresponder a 75% da renda familiar. Elas também podem receber aposentadorias, pensões, benefícios sociais, aluguéis, juros e dividendos. Mas 2% da população, ou 4 milhões de pessoas, não recebem qualquer tipo de remuneração. O percentual dobrou em relação a 2012 e representa a maior parcela já registrada de brasileiros sem qualquer tipo de renda.
Embora a precarização do trabalho tenha atingido níveis recordes no país nesses anos de Bolsonaro e seu ministro-mascate Paulo Guedes, a renda informal não retornou para as famílias no mesmo nível de antes da pandemia, atesta o sociólogo. “São menos recebedores, com renda menor e vínculos mais frágeis”, afirma.
Trabalhadores informais ainda não recuperaram renda pré-pandemia
“Muitas pessoas perderam o pouco capital que tinham, coisas simples, como uma barraca, um carrinho de pipoca, para conseguir se manter ou pelo menos alugar. Durante a pandemia, sem fonte de recurso, tiveram que vender esse capital”, lembra o professor da Universidade de São Paulo (USP) Naercio Menezes Filho. “Essas famílias estão vivendo uma situação muito difícil.”
Menezes, também diretor do Centro de Pesquisa Aplicada à Primeira Infância do Insper, ressalta que a transição no mercado de trabalho inclui máquinas e inteligência artificial substituindo trabalhadores em tarefas simples e rotineiras. Os empregos formais são criados para tarefas não repetitivas, que exigem capacidade de negociação e análise.
“São pessoas que não têm essas habilidades, não tiveram formação de ensino médio, não tiveram oportunidades, não conseguiram desenvolver as habilidades cognitivas”, prossegue o professor. “Muitas perderam o pouco que tinham e, ao mesmo tempo, houve essa mudança no mercado.”
Parte desse grupo, principalmente as pessoas mais velhas, não vai mais retornar ao mercado de trabalho, diz Menezes. Sintoma disso é o crescimento do desemprego de longa duração. No segundo trimestre deste ano, havia 3 milhões de desempregados que procuram vaga há dois anos ou mais, o que corresponde a 29,6% dos desocupados, conforme a Pnad Contínua.
Menezes cita como exemplo de transformação o uso de robôs em operadoras de call center. Isso está afetando mais o emprego no Nordeste, onde 25,7% da população vivem em domicílios sem renda do trabalho. Entre os ocupados na região, 57,1% são informais. “Há uma estratificação regional, o trabalho só tem aumentado no Sul e Sudeste. No Nordeste está estagnado. A desigualdade regional aumentou”, aponta.
“Está na contramão da tendência anterior, entre o início do século e meados de 2010, quando houve ganho de renda na base da pirâmide”, afirma o sociólogo Pedro Ferreira de Souza. “Naqueles anos, a geração de emprego formal foi em setores que absorvem mão de obra menos qualificada. Depois da recessão, essa geração de emprego na base parou. A renda dos 20% mais pobres caiu muito e nunca mais se recuperou nem voltou ao patamar que estava em 2012.”
Lula: estímulo a pequenos negócios e a trabalhadores por conta própria
No primeiro turno, Luiz Inácio Lula da Silva recebeu mais votos que Bolsonaro em oito das dez cidades que mais perderam postos de trabalho formais neste ano. As quatro cidades que mais perderam empregos até agosto, em números absolutos, estão na região Nordeste: Sirinhaém (PE), Capela (SE), São José da Laje (AL) e Rio Formoso (PE).
Em seguida, aparecem Indianópolis (MG), Parauapebas (PA), Lucélia (SP), São Miguel dos Campos (AL), Santo Antônio dos Lopes (MA) e Campo Alegre (AL). Bolsonaro só teve mais votos do que Lula no município paraense e no paulista.
“Em cidades pequenas, o fechamento de vagas tem um impacto brutal. Muitos dependem do setor público para ter emprego também”, explica Sergio Firpo, pesquisador do Insper e colunista da Folha de São Paulo. “A mobilidade nesses locais é menor e a transição de um emprego para o outro ocorre em um intervalo maior.”
“A memória positiva que as pessoas têm dos governos petistas no Nordeste se deve ao crescimento acima da média dos estados durante a década de 2000, com aumento de salários e inclusão por meio de programas de transferência de renda”, acrescenta Firpo.
Para o pesquisador, pode ter havido “uma certa demora” do desgoverno Bolsonaro em lidar com o Bolsa Família. “Faltou um olhar para a população mais pobre durante os primeiros anos de mandato, com aumento da fila, falta de atualização do cadastro e de destaque para a política social. Os frutos podem estar sendo colhidos agora.”
“O cidadão que perdeu o emprego em uma cidade como Sirinhaém até pode ter visto que a inflação parou de subir. Mas ele também percebe que a inflação ainda está estacionada no 15º andar. Essa é a economia real. É o que o cidadão sente na hora de fazer a feira, de ir ao supermercado”, complementa Edgard Leonardo Lima, professor do Centro Universitário Tiradentes.
Na manhã desta segunda-feira (10), Lula reafirmou o compromisso de estimular o pequeno e médio empreendedor individual e a organização de cooperativas para que as pessoas encontrem novas formas de trabalho e renda.
“Tem muita gente que quer trabalhar por conta própria. Nós vamos incentivar essas pessoas a serem empreendedoras, e vai ter financiamento do Banco do Brasil, vai ter financiamento do BNDES, vai ter financiamento da Caixa Econômica Federal para isso”, anunciou em entrevista à Super Rádio Tupi.
(Agência PT)
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