Paris - A presidenta brasileira Dilma Rousseff prosseguiu
quarta-feira em Paris sua dupla ofensiva, ao mesmo tempo política,
contra as medidas de austeridade que estão sendo impostas em toda a
Europa, e também comercial, com a oferta feita aos empresários franceses
para que invistam no Brasil. Em ambos os casos, a partida parece ganha:
a política, porque esse é o credo do presidente socialista François
Hollande, que propõe uma combinação de poupança pública e investimentos
para fomentar o emprego; a segunda, com a sedução do empresariado
francês. Como prova disso, o influente semanário econômico “Challanges”
dedicou a capa à visita de Dilma a França. A manchete não poderia ser
mais explícita: “Brasil, o país onde é preciso estar”. O Brasil, de
fato, atraiu a atenção da mídia francesa.
A dupla presença de
Dilma e do ex-presidente Lula aqueceu e deu conteúdo ao frio outono
francês. Lula participou do fórum internacional para o progresso social
organizado conjuntamente pelo Instituto Lula e pela Fundação Jean Jaurés
sob o lema “Escolher o crescimento, sair da crise”. O ex-presidente
disse aos seus interlocutores que a crise era uma oportunidade para
repensar a política.
Dilma Rousseff colocou uma carta tentadora
sobre a mesa: durante seu encontro com a cúpula patronal francesa, a
presidenta anunciou um ambicioso plano de infraestrutura aeroportuária:
“os números no Brasil são enormes. Temos a intenção de construir cerca
de 800 aeroportos ou mais. Serão construídos em cidades com mais de 100
mil habitantes”. A mandatária acrescentou que “queremos que todas as
cidades com mais de 100 mil habitantes tenham acesso a um aeroporto que
esteja a uma distância máxima de 50 ou 60 quilômetros do centro”. A
realização deste projeto, assinalou, é “uma necessidade importante para o
crescimento do país”.
Na mesma reunião com os empresários
franceses, da qual participou um representante da ala esquerda do
Partido Socialista, no poder, o ministro da Indústria, Arnaud
Montebourg, ao lado de seu homólogo brasileiro, Fernando Pimentel, fixou
o horizonte dos possíveis investimentos: “temos que buscar a abertura
econômica, mas sem que isso signifique aceitar práticas depredadoras no
comércio internacional, como vemos acontecer na Ásia”, disse o ministro.
A
delegação brasileira surpreendeu os empresários franceses pela firmeza
de suas propostas. Neste contexto, a presidenta Dilma criticou duramente
as políticas de austeridade e chamou a França a reforçar a colaboração
com seu país a fim de “explorar as novas oportunidades que a crise
oferece”. Diante do empresariado, em vários momentos com ar maravilhado,
a chefe de Estado brasileira expôs sua convicção de que “a redução dos
gastos, a política monetária exclusiva e a diminuição dos direitos
sociais não constituem uma resposta à crise”. Dilma se baseou no próprio
exemplo do passado latino-americano – anos 80 e 90 – para defender seu
ponto de vista: “ninguém reconhecia que as medidas que aumentavam as
desigualdades, o desemprego e a desesperança nos países
latino-americanos não levava a parte alguma”.
Em resposta à
solicitação de uma cooperação renovada com Paris, o ministro da
Indústria francês convidou o Brasil a “utilizar a França como cabeça de
ponte” para o mercado europeu. Com respeito à compra ainda suspensa de
36 aviões Rafale, do fabricante Dassault, por cerca de 4 bilhões de
euros, a dirigente brasileira precisou que, em função da crise, essa
decisão segue suspensa. A história desses aviões é uma espécie de grande
montagem organizada pelo ex-presidente francês Nicolas Sarkozy.
Em
setembro de 2009, Sarkozy fez uma viagem relâmpago ao Brasil para
negociar com Lula a venda dos aviões Rafale. De volta a Paris, Sarkozy
deu o negócio por consumado e abriu garrafas de champagne para festejar
publicamente o contrato. Nesta época, o entorno presidencial assegurava
que os “brasileiros não podiam rechaçar essa proposta”. Na verdade, nada
estava concretizado ainda.
A visita de Dilma Rousseff a França
serviu também para que o Fundo Mundial da Natureza (WWF) interpelasse
Paris e Brasília para que ambos ratifiquem e façam entrar em vigor o
acordo firmado em 2008 pelos dois países para lutar contra a exploração
selvagem de ouro. Em um chamado a Paris e Brasília publicado pelo
matutino Libération e assinado pelos responsáveis do WWF na França e no
Brasil, o Fundo Mundial para a natureza denuncia a situação que impera
nas fronteiras comuns que França e Brasil compartilham na Guiana: “no
coração dessas gigantescas zonas protegidas e dedicadas à biodiversidade
e às comunidades locais, um mal profundo se instalou: a febre do ouro”.
Para a WWF, a visita de Dilma Rousseff é uma “oportunidade única” para
que “se detenha a exploração aurífera ilegal nas zonas protegidas”.
(Edouardo Febbro- Carta Maior/tradução Karina Peixoto)
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