Eis o nota do Vermelho a respeito da anistia ao teatrólogo José Celso Martinez Correa:Dramaturgo Zé Celso é anistiado em sessão emocionada
O hino tocou, mas em ritmo de bossa nova e pancadão. Autoridades estavam lá, mas ao lado de atores nus, que apresetariam espetáculo em homenagem a Eros. Ao invés de ocorrer nos salões de Brasília, o julgamento do pedido de anistia do ‘papa’ do teatro brasileiro, José Celso Martinez Corrêa, foi no Teatro Oficina, especificamente sobre a mesa que é cenário da peça que viria depois. Em sessão emocionada, o Estado brasileiro pediu perdão pelas violações que cometeu contra Zé Celso na ditadura.
Zé Celso recebeu homenagem em evento concorrido que depois contou com a apresentação da peça "O Banquete"
Em 22 de maio de 1974, o teatrólogo foi encapuzado por agentes da repressão e levado ao Departamento de Ordem Política e Social (Dops), em São Paulo, onde passaria quase um mês. Nesse período, foi torturado. Recebeu choque elétrico, ficou pendurado no pau de arara e apanhou muito. Chegou a ser confinado em uma solitária.
Depois de solto, permaneceu em liberdade condicional. Com um trabalho sempre engajado, Zé Celso se viu sem condições de desempenhar sua atividade profissional no país. Partiu para um exílio que duraria cinco anos.
Mais de três décadas depois, ele recebeu, nesta quarta (07), o perdão oficial do Estado, concluindo seu processo de anistia que tramitava desde 2002. E, como não poderia deixar de ser, em se tratando do ousado e inventivo Zé Celso, o ato simbólico nada teve de solene. Começou do lado de fora do teatro, onde atores trajados com o figurino diminuto do espetáculo “O Banquete” entoavam cantigas e convidavam o público e as autoridades a entrarem.
Em seguida, como ocorre nas apresentações, todos – obrigatoriamente descalços - foram conduzidos a um lava-pés. Aberto à população e gratuito, o ato começou em seguida, como parte da “Caravana da Anistia” - sessões públicas itinerantes nas quais são apreciados os requerimentos de anistia política. As caravanas são promovidas pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.
O julgamento ocorreu integrado ao cenário e à platéia na qual se encontravam também os atores. Tanto que o presidente da comissão da Anistia, Paulo Abrão, ao receber a instrução de dirigir-se à mesa, questionou: “mas onde está a mesa?” Tratava-se de uma longa passarela coberta de vermelho, em torno e sobre a qual se desenrolaria “O Banquete” e toda a sessão.
Esta foi a primeira vez que um julgamento ocorreu dentro de um teatro. “É importante levar o julgamento para onde as pessoas tiveram suas vidas violadas. Estamos aqui para reconhecer as responsabilidades do Estado na repressão, mas também para resgatar a dignidade de pessoas que sofreram porque não baixaram guarda”, disse Abrão.
O relator do processo, Prudente Mello, que foi ator, leu seu voto caminhando pela passarela e descartando no chão as páginas já ditas. Ele resgatou a trajetória de Zé Celso, o cenário político à época da ditadura e toda a perseguição, violência e repressão pela qual o dramaturgo passou.
Citando trechos de poemas e canções relacionadas à obra de Zé Celso, ele concluiu que tais violações do Estado, além de atentarem contra os direitos humanos, prejudicaram também o exercício profissional do teatrólogo. Sua carreira de diretor e a atuação de seu grupo Oficina foram cerceadas pelo regime autoritário.
O voto do relator, aprovado por unanimidade pelos nove conselheiros, determinou ainda uma reparação econômica a Zé Celso. Ele receberá uma pensão mensal de R$ 5 mil reais, que deve ser retroativa a julho de 2001. O valor acumulado soma cerca de R$569 mil.
Denúncia contra a tortura
Anfitrião, Zé Celso começou sua fala entoando o hino oswaldiano “tupi or not tupi, that is the question”. Entre danças e cantos, ele deu uma aula sobre identidade brasileira. Elogiou o governo Lula e incentivou esforços para romper a burocracia estatal, herdada da ditadura. Vestido de terno e gravata – destoando de seus colegas de palco -, o teatrólogo confessou: “No governo anterior, não pisei no MinC, porque tinha um sociólogo idiota por lá”.
Zé Celso contou que, após ser torturado, foi levado pelos seus algozes até uma porta. “Tiraram meu capuz e, quando a porta abriu, eu entrei na legalidade. Vi que vivemos em uma sociedade na qual o que é podre está escondido. Por isso entendo que o que é tabu tem que se discutido, trazido à tona”, disse diretor. “Depois da prisão, eu sacralizei o corpo, por isso adoro a nudez.”
Ele usou seu discurso para falar também sobre a tortura praticada pela polícia e destacou a importância do Plano Nacional de Direitos Humanos. Em entrevista coletiva, defendeu: “É importante o Estado fazer essa reparação, mas temos que ter os olhos muito voltados para hoje também, porque há problemas gravíssimos ainda”.
“Esse evento foi muito significativo, estão aqui pessoas poderosas que lutam para que os torturadores sejam punidos. E temos que lembrar que preso político e bandido é tudo gente. Não pode haver tortura para nenhum, é imperdoável”, completou.
A caravana
“O compromisso da Caravana da anistia é com a verdade das vítimas, com aquela vozes que foram caladas no passado, não com a verdade oficialesca”, disse Paulo Abrão no evento. Ele informou que a caravana, que existe desde 2001, já julgou 53 mil de um total de 65 mil processos apresentados à comissão de anistia. Destes, 33 mil foram deferidos.
“Quando o caso é notório, os fatos são conhecidos, é mais fácil. Mas outros casos só poderão ser reparados com a abertura dos arquivos da ditadura. É importante exercer o direito à verdade”, encerrou.
Pensando em agregar uma atividade cultural aos julgamentos itinerantes, a 35ª Caravana da Anistia promoveu, ao final da sessão, em parceria com o teatro Oficina, a peça “O Banquete”, de Platão, sobre Eros, o deus do amor.
Da Redação,
Joana RozowykwiatDramaturgo Zé Celso é anistiado em sessão emocionada
O hino tocou, mas em ritmo de bossa nova e pancadão. Autoridades estavam lá, mas ao lado de atores nus, que apresetariam espetáculo em homenagem a Eros. Ao invés de ocorrer nos salões de Brasília, o julgamento do pedido de anistia do ‘papa’ do teatro brasileiro, José Celso Martinez Corrêa, foi no Teatro Oficina, especificamente sobre a mesa que é cenário da peça que viria depois. Em sessão emocionada, o Estado brasileiro pediu perdão pelas violações que cometeu contra Zé Celso na ditadura.
Lenise Pinheiro/UOL
Ze Celso
Zé Celso recebeu homenagem em evento concorrido que depois contou com a apresentação da peça "O Banquete"
Em 22 de maio de 1974, o teatrólogo foi encapuzado por agentes da repressão e levado ao Departamento de Ordem Política e Social (Dops), em São Paulo, onde passaria quase um mês. Nesse período, foi torturado. Recebeu choque elétrico, ficou pendurado no pau de arara e apanhou muito. Chegou a ser confinado em uma solitária.
Depois de solto, permaneceu em liberdade condicional. Com um trabalho sempre engajado, Zé Celso se viu sem condições de desempenhar sua atividade profissional no país. Partiu para um exílio que duraria cinco anos.
Mais de três décadas depois, ele recebeu, nesta quarta (07), o perdão oficial do Estado, concluindo seu processo de anistia que tramitava desde 2002. E, como não poderia deixar de ser, em se tratando do ousado e inventivo Zé Celso, o ato simbólico nada teve de solene. Começou do lado de fora do teatro, onde atores trajados com o figurino diminuto do espetáculo “O Banquete” entoavam cantigas e convidavam o público e as autoridades a entrarem.
Em seguida, como ocorre nas apresentações, todos – obrigatoriamente descalços - foram conduzidos a um lava-pés. Aberto à população e gratuito, o ato começou em seguida, como parte da “Caravana da Anistia” - sessões públicas itinerantes nas quais são apreciados os requerimentos de anistia política. As caravanas são promovidas pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.
O julgamento ocorreu integrado ao cenário e à platéia na qual se encontravam também os atores. Tanto que o presidente da comissão da Anistia, Paulo Abrão, ao receber a instrução de dirigir-se à mesa, questionou: “mas onde está a mesa?” Tratava-se de uma longa passarela coberta de vermelho, em torno e sobre a qual se desenrolaria “O Banquete” e toda a sessão.
Esta foi a primeira vez que um julgamento ocorreu dentro de um teatro. “É importante levar o julgamento para onde as pessoas tiveram suas vidas violadas. Estamos aqui para reconhecer as responsabilidades do Estado na repressão, mas também para resgatar a dignidade de pessoas que sofreram porque não baixaram guarda”, disse Abrão.
O relator do processo, Prudente Mello, que foi ator, leu seu voto caminhando pela passarela e descartando no chão as páginas já ditas. Ele resgatou a trajetória de Zé Celso, o cenário político à época da ditadura e toda a perseguição, violência e repressão pela qual o dramaturgo passou.
Citando trechos de poemas e canções relacionadas à obra de Zé Celso, ele concluiu que tais violações do Estado, além de atentarem contra os direitos humanos, prejudicaram também o exercício profissional do teatrólogo. Sua carreira de diretor e a atuação de seu grupo Oficina foram cerceadas pelo regime autoritário.
O voto do relator, aprovado por unanimidade pelos nove conselheiros, determinou ainda uma reparação econômica a Zé Celso. Ele receberá uma pensão mensal de R$ 5 mil reais, que deve ser retroativa a julho de 2001. O valor acumulado soma cerca de R$569 mil.
Denúncia contra a tortura
Anfitrião, Zé Celso começou sua fala entoando o hino oswaldiano “tupi or not tupi, that is the question”. Entre danças e cantos, ele deu uma aula sobre identidade brasileira. Elogiou o governo Lula e incentivou esforços para romper a burocracia estatal, herdada da ditadura. Vestido de terno e gravata – destoando de seus colegas de palco -, o teatrólogo confessou: “No governo anterior, não pisei no MinC, porque tinha um sociólogo idiota por lá”.
Zé Celso contou que, após ser torturado, foi levado pelos seus algozes até uma porta. “Tiraram meu capuz e, quando a porta abriu, eu entrei na legalidade. Vi que vivemos em uma sociedade na qual o que é podre está escondido. Por isso entendo que o que é tabu tem que se discutido, trazido à tona”, disse diretor. “Depois da prisão, eu sacralizei o corpo, por isso adoro a nudez.”
Ele usou seu discurso para falar também sobre a tortura praticada pela polícia e destacou a importância do Plano Nacional de Direitos Humanos. Em entrevista coletiva, defendeu: “É importante o Estado fazer essa reparação, mas temos que ter os olhos muito voltados para hoje também, porque há problemas gravíssimos ainda”.
“Esse evento foi muito significativo, estão aqui pessoas poderosas que lutam para que os torturadores sejam punidos. E temos que lembrar que preso político e bandido é tudo gente. Não pode haver tortura para nenhum, é imperdoável”, completou.
A caravana
“O compromisso da Caravana da anistia é com a verdade das vítimas, com aquela vozes que foram caladas no passado, não com a verdade oficialesca”, disse Paulo Abrão no evento. Ele informou que a caravana, que existe desde 2001, já julgou 53 mil de um total de 65 mil processos apresentados à comissão de anistia. Destes, 33 mil foram deferidos.
“Quando o caso é notório, os fatos são conhecidos, é mais fácil. Mas outros casos só poderão ser reparados com a abertura dos arquivos da ditadura. É importante exercer o direito à verdade”, encerrou.
Pensando em agregar uma atividade cultural aos julgamentos itinerantes, a 35ª Caravana da Anistia promoveu, ao final da sessão, em parceria com o teatro Oficina, a peça “O Banquete”, de Platão, sobre Eros, o deus do amor.
4 comentários:
Na história os corvades sempre perdem. valeu jorginho amorim a postagem em homenagem a José Celso o nosso urubu-rei.
abraços.
AMorim! Passei só pra dizer que leio todas as suas postagens. Adoro seu blog porque ele realmente é interessante! Um dos poucos que leio e tenho identidade de opiniões.
Um abraço da sua amiga Meg.
Muito obrigado, amiga. Um abraço extensivo ao Kleber.
É isso aí, grande Rui. Quarta-feira nos encontramos na oca do Índio.
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