Armas de fogo causaram 71,1% das 62.517 mortes no Brasil em 2016. Esse total representa um recorde histórico: o país atingiu a taxa de 30 assassinatos para cada 100 mil habitantes. A taxa de homicídios é 30 vezes a da Europa. Os dados são do Atlas da Violência 2018, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com base em dados do Ministério da Saúde. Nos últimos dez anos, 553 mil pessoas perderam a vida vítimas de violência no Brasil.
Para David Marques, pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a violência letal não é distribuída de forma homogênea no tecido social brasileiro, mas está sujeita a interferência de fatores demográficos, socioeconômicos e também da atuação do próprio Estado, responsável pelas políticas públicas de segurança.
"Quando se fala em violência, a gente pode falar em termos de vulnerabilidades, ou seja, de ausências de bens que poderiam, por exemplo, ser fornecidos pelo Estado. Tradicionalmente, a gente trabalha no Brasil com políticas que são meramente reativas ao fenômeno do crime e da violência, muito na chave da repressão. Hoje, a grande necessidade é qualificar as políticas repressivas que temos e construir políticas de prevenção da violência, que se antecipem a ocorrência desses crimes."
Entre 2006 e 2016, a taxa de homicídios entre a população negra aumentou 23,1% enquanto a taxa entre não negros caiu 6,8%. O mesmo acontece entre mulheres negras, quando, nesse período, a taxa de homicídio aumentou 15,4%, mas teve redução de 8% entre as mulheres não negras. De acordo com o Atlas da Violência, 71,5% das pessoas que foram assassinadas no país em 2016 eram negras.
No comparativo anual, de 2015 para 2016, só na região Centro-Oeste a taxa de homicídios se manteve no mesmo patamar. No restante das regiões, foi registrado um aumento no número de mortes, com valores mais significativos no Norte e no Nordeste.
O antropólogo e fundador do curso de graduação em Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense, Lenin Pires, defende que a desigualdade social e racial são reforçadas pela Justiça, que representa "uma expressão das classes abastadas de oligarquias".
"Nesse panorama nós estamos, na verdade, em uma eliminação étnica não declarada. É um genocídio não declarado de alguns segmentos. E essa desigualdade ganha maior proporção justamente em função da desigualdade jurídica, onde cada vez mais fica claro que o sistema judiciário tem predileções; ele vai administrar a justiça entendendo que há sujeitos que são desiguais em relação aos outros: uns são merecedores de cadeia, outros de cadeia especial, outros não são merecedores de cadeia nenhuma."
Pires diz que o recurso da arma de fogo significa que o país está cada vez mais intolerante, seja no caso da violência policial (Estado) seja por parte de um cidadão comum. Ele acrescenta que a impunidade exacerbada fortalece a crença de fazer "justiça pelas próprias mãos".
Marques diz que o Estudo do Desarmamento (2003), que proíbe o porte de armas por civis, com exceção para os casos onde haja necessidade comprovada, amenizou esse contexto de violência. Mas defende que ainda carecemos de uma política de inteligência consistente para a retirada de circulação das armas de fogo, sobretudo das ilegais.
"A existência do Estatuto do Desarmamento conseguiu frear uma certa corrida armamentista e um certo crescimento mais acelerado da violência no Brasil. Não houvesse o Estatuto do Desarmamento, nossa taxa de homicídio seria 12% maior," defende Marques.
O pesquisador destaca que a estrutura de regulação sobre as armas de fogo no mercado legal também apresenta problemas. Ele diz que o controle sobre as armas e as munições institucionais também precisa ser aprimorado: "O caso mais recente, que teve repercussão, foi, por exemplo, o do assassinato da vereadora Marielle Franco, no Rio de Janeiro, cujos cartuchos utilizados no assassinato tinham sido desviados de material institucional da Polícia Federal, que havia sido repassado aos estados."
Conforme o Atlas da Violência, a taxa de homicídios no Rio de Janeiro aumentou 18,8% em 2016, em comparação com o ano anterior. Já no comparativo de 2011 a 2016, a alta registrada foi de 22,6%. E por mais que o relatório não contemple os dados da atual crise de segurança no estado, o Rio já ficava bem à frente de São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais no número de mortes em 2016.
Marques destaca ainda que a violência letal é decorrente de dinâmicas criminais, em função do narcotráfico e do tráfico de armas: "A partir do momento que existe um sistema internacional de guerra às drogas, em grande medida, isso contribui para esse cenário de estabelecimento de mercados ilegais, com acesso facilitado à armas de fogo, que possibilita então o surgimento desses grupos que vão disputar territórios, rotas e um mercado que é altamente lucrativo."
O estudo destaca ainda que em 2016, 4.645 mulheres foram assassinadas no país, o que representa uma taxa de 4,5 homicídios para cada 100 mil brasileiras. O aumento nos últimos 10 anos foi de 6,4%. Além disso, associando o racismo ao feminicídio, percebe-se que a taxa de homicídios de mulheres negras foi 71% superior à de mulheres não negras.
Para David Marques, pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a violência letal não é distribuída de forma homogênea no tecido social brasileiro, mas está sujeita a interferência de fatores demográficos, socioeconômicos e também da atuação do próprio Estado, responsável pelas políticas públicas de segurança.
"Quando se fala em violência, a gente pode falar em termos de vulnerabilidades, ou seja, de ausências de bens que poderiam, por exemplo, ser fornecidos pelo Estado. Tradicionalmente, a gente trabalha no Brasil com políticas que são meramente reativas ao fenômeno do crime e da violência, muito na chave da repressão. Hoje, a grande necessidade é qualificar as políticas repressivas que temos e construir políticas de prevenção da violência, que se antecipem a ocorrência desses crimes."
Entre 2006 e 2016, a taxa de homicídios entre a população negra aumentou 23,1% enquanto a taxa entre não negros caiu 6,8%. O mesmo acontece entre mulheres negras, quando, nesse período, a taxa de homicídio aumentou 15,4%, mas teve redução de 8% entre as mulheres não negras. De acordo com o Atlas da Violência, 71,5% das pessoas que foram assassinadas no país em 2016 eram negras.
No comparativo anual, de 2015 para 2016, só na região Centro-Oeste a taxa de homicídios se manteve no mesmo patamar. No restante das regiões, foi registrado um aumento no número de mortes, com valores mais significativos no Norte e no Nordeste.
O antropólogo e fundador do curso de graduação em Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense, Lenin Pires, defende que a desigualdade social e racial são reforçadas pela Justiça, que representa "uma expressão das classes abastadas de oligarquias".
"Nesse panorama nós estamos, na verdade, em uma eliminação étnica não declarada. É um genocídio não declarado de alguns segmentos. E essa desigualdade ganha maior proporção justamente em função da desigualdade jurídica, onde cada vez mais fica claro que o sistema judiciário tem predileções; ele vai administrar a justiça entendendo que há sujeitos que são desiguais em relação aos outros: uns são merecedores de cadeia, outros de cadeia especial, outros não são merecedores de cadeia nenhuma."
Pires diz que o recurso da arma de fogo significa que o país está cada vez mais intolerante, seja no caso da violência policial (Estado) seja por parte de um cidadão comum. Ele acrescenta que a impunidade exacerbada fortalece a crença de fazer "justiça pelas próprias mãos".
Marques diz que o Estudo do Desarmamento (2003), que proíbe o porte de armas por civis, com exceção para os casos onde haja necessidade comprovada, amenizou esse contexto de violência. Mas defende que ainda carecemos de uma política de inteligência consistente para a retirada de circulação das armas de fogo, sobretudo das ilegais.
"A existência do Estatuto do Desarmamento conseguiu frear uma certa corrida armamentista e um certo crescimento mais acelerado da violência no Brasil. Não houvesse o Estatuto do Desarmamento, nossa taxa de homicídio seria 12% maior," defende Marques.
O pesquisador destaca que a estrutura de regulação sobre as armas de fogo no mercado legal também apresenta problemas. Ele diz que o controle sobre as armas e as munições institucionais também precisa ser aprimorado: "O caso mais recente, que teve repercussão, foi, por exemplo, o do assassinato da vereadora Marielle Franco, no Rio de Janeiro, cujos cartuchos utilizados no assassinato tinham sido desviados de material institucional da Polícia Federal, que havia sido repassado aos estados."
Conforme o Atlas da Violência, a taxa de homicídios no Rio de Janeiro aumentou 18,8% em 2016, em comparação com o ano anterior. Já no comparativo de 2011 a 2016, a alta registrada foi de 22,6%. E por mais que o relatório não contemple os dados da atual crise de segurança no estado, o Rio já ficava bem à frente de São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais no número de mortes em 2016.
Marques destaca ainda que a violência letal é decorrente de dinâmicas criminais, em função do narcotráfico e do tráfico de armas: "A partir do momento que existe um sistema internacional de guerra às drogas, em grande medida, isso contribui para esse cenário de estabelecimento de mercados ilegais, com acesso facilitado à armas de fogo, que possibilita então o surgimento desses grupos que vão disputar territórios, rotas e um mercado que é altamente lucrativo."
O estudo destaca ainda que em 2016, 4.645 mulheres foram assassinadas no país, o que representa uma taxa de 4,5 homicídios para cada 100 mil brasileiras. O aumento nos últimos 10 anos foi de 6,4%. Além disso, associando o racismo ao feminicídio, percebe-se que a taxa de homicídios de mulheres negras foi 71% superior à de mulheres não negras.
(Brasil de Fato)
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