Jorge Paz Amorim

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Sou Jorge Amorim, Combatente contra a viralatice direitista que assola o país há quinhentos anos.

quarta-feira, 21 de junho de 2017

"Temer desmonta instrumentos de crescimento e bem-estar social"


No primeiro dia de visita oficial de Michel Temer (PMDB) à Rússia, nesta segunda-feira (20), o presidente afirmou que as medidas adotadas desde a destituição de Dilma Rousseff (PT) colocaram o país na “trilha da responsabilidade e do crescimento”, conferindo um grau de normalidade à intensa crise política vivida pelo país desde a delação da JBS à Procuradoria-Geral da República (PGR).

Alheio ao aumento progressivo das taxas de desemprego, na ordem de 13,7% (Pnad Contínua/IBGE), e os impactos para a população de baixa renda com o corte de gastos públicos já em vigência em 2017 por meio da Emenda Constitucional 95 (anterior PEC 55/241, de congelamento de gastos públicos em 20 anos, promulgada em dezembro), o presidente afirmou no início de junho que “a recessão já acabou”.

Em entrevista concedida à Página do MST, o professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e diretor do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (CECON) da mesma universidade, Pedro Rossi, analisa como as escolhas econômicas feitas pelo governo, ao contrário do exposto pelo presidente, acentuam um contexto de fragilidade social, em especial para a população de baixa renda. “Num momento que a população precisa de mais políticas públicas de emprego, saúde, de assistência, o estado contrai seus gastos. Isso deteriora a situação social”, aponta Pedro.

Ele reflete ainda sobre o aprofundamento das políticas de austeridade pelo governo Temer, o desmonte dos papéis do estado em induzir o desenvolvimento e gerar o bem-estar social e a responsabilidade dos movimentos populares em reverter as medidas de fragilização da democracia.

MST: Professor, em um texto de sua autoria, o senhor afirma que a crise econômica que vivemos, além do caráter multifatorial, também apresenta elementos específicos. Quais são?

Pedro Rossi: Uma crise econômica sempre tem vários aspectos. Esta é maior crise econômica da história brasileira no aspecto da contração de renda da população. Em média, a renda dos brasileiros, o poder de compra da população, caiu 7% em relação a 2014. Toda média, um valor síntese, não analisa o fenômeno por completo, o significa que para uma parte da população essa renda caiu mais [do que 7%] e para outra caiu menos. Essa contração atinge mais os vulneráveis, na medida em que a contração da renda está conjugada, neste momento, com o tamanho do estado. Num momento que a população precisa de mais políticas públicas de emprego, saúde, de assistência, o estado contrai seus gastos. Isso deteriora a situação social. A contração de renda então se reflete na piora de vida das pessoas.

O estado se vale do argumento, com uso de propaganda oficial, de que se as reformas em curso (trabalhista e previdenciária) não forem aprovadas o salário mínimo não será garantido. Como a população compreende este discurso como viável - de que cortes atuais se justificam em nome de um “futuro seguro”?

O governo usa uma linguagem, no campo da economia, que é simplista e moralista. É quase como se contasse a história da cigarra e da formiga. A metáfora de que você passou muito tempo cantando e agora tem que trabalhar. O governo tem dito que o Brasil passou por um momento de aumento salarial, de excesso de gastos sociais e uso de muitos recursos para população mais pobre e que agora veio a conta e é preciso pagar esta conta. Isto é um discurso moralista.

O outro discurso metafórico é a de que a economia brasileira é como a da de dona de casa. Essa metáfora é machista e absolutamente equivocada. O governo não funciona como a economia doméstica. Isto porque as famílias não definem quanto vão ganhar, elas ganham a renda pelo seu trabalho. Já o governo sim, define quanto arrecada. Então se quiser cobrir setores fundamentais, por decisão política, ele cobre. Não é uma questão abstrata como o governo argumenta, “de que é necessário cortar gastos”. Não é, é uma decisão política.

O corte de gastos sociais fragiliza a ideia de estado como indutor do desenvolvimento, compreensão inaugurada no Brasil pela Constituição. O fato de terem sido implementadas medidas de intensificação da austeridade, como a Emenda Constitucional 95, aponta que a ideia do estado como garantidor das condições de vida ainda não é sólida?

A população tem claro que o estado deve prover bens fundamentais. Nas pesquisas, a população não demonstra que tem uma visão liberal do funcionamento da ordem social, ela acha que o estado tem obrigação de dar educação, saúde. Neste sentido, o povo não aprovaria o que está sendo feito agora, as medidas do governo Temer não passariam por um pleito eleitoral. Só um governo ilegítimo seria capaz de implementar este tipo de medidas.

Em uma sociedade democrática, temos o estado indutor do crescimento e o estado provedor de bens públicos ou de bens sociais. O governo Temer está desmontando estas duas frentes: o desmonte dos instrumentos capazes de gerar crescimento econômico (com medidas que afetam as estatais, a política fiscal, o investimento público) e o desmonte de instrumentos capazes de gerar bem social (as reformas da Previdência e trabalhista e o congelamento do gasto social). Então o que vivemos hoje é um amplo desmonte, diferente do que ocorreu no governo Dilma Rousseff. O segundo governo de Dilma (2015-2016) fez o contrário do que defendeu nas eleições [presidenciais de 2014]. O governo promoveu uma política de austeridade sem reformas estruturais. O que o governo Temer está fazendo é uma mudança completa na estratégia onde o objetivo a longo prazo é fazer reformas estruturais para evitar que o estado possa voltar a fazer as políticas que fazia antes, para induzir crescimento e gerar bem-estar social.

Considerando que a crise econômica não é exclusividade do Brasil e a adoção de uma política econômica é uma escolha de governo, como o estado brasileiro pode garantir o caráter de indutor do desenvolvimento e gerador de bem-estar social em contexto de recessão? Quais outras escolhas podem ser feitas?


No final de 2014, quando a Dilma ganha a eleição, o desemprego era da ordem de 4,5%. Tínhamos cinco milhões de desempregados no Brasil antes das políticas de austeridade adotadas. Por algum motivo, a mídia se convenceu que era preciso fazer um ajuste muito grande, que foi feito em 2015. Passados dois anos, a taxa de desemprego saltou e temos entre 13 a 14 milhões de desempregados. A política de austeridade contribuiu para nos colocar nesse buraco que estamos.

É importante considerar que a economia funciona com base no gasto das pessoas, das famílias, das empresas, do governo e da demanda externa. Em 2015, o consumo das famílias estava caindo, as empresas investiam menos, a demanda externa estava fraca por um cenário internacional ruim. E o governo, que é a única variável de gasto que poderia contribuir com o crescimento, cortou o gasto público. Temos então que todas as variáveis de gastos começam a cair.

O governo tem que gastar quando as outras variáveis não gastam. É o contrário da metáfora machista da dona de casa usada pelo governo: quando uma família está gastando muito o governo deve contrair os gastos. Quando a família contrai os gastos é hora de o governo gastar para garantir o emprego, o crescimento econômico mínimo e a própria receita do governo. Por isso é a política de austeridade é contraproducente. Se o governo começar a cortar gastos, o investimento cai, e se arrecada menos. A gente entrou numa bola de neve em que o PIB caiu, a arrecadação do governo caiu, o déficit aumentou e o governo cortou ainda mais gastos. Com estas ações, o PIB cai ainda mais, é um círculo vicioso. O resultado final é crescimento da dívida, o contrário do que a austeridade propõe, e um crise que a gente não consegue sair.

Se o estado conseguisse manter o nível de crescimento razoável em 2015, provavelmente não teríamos essa crise, e não haveria ocorrido a destituição da presidenta Dilma. O estado poderia ter implementado medidas, tal como estava na plataforma eleitoral, de sustentação do gasto social e aumento do investimento público.

Com a vigência do congelamento de gastos públicos já neste ano de 2017 e as reformas trabalhista e previdenciária em curso, como o contexto de crise econômica e impacto para o trabalhador deve ser acentuado?


Temos que pensar na palavra revogação nos próximos anos. É papel dos movimentos sociais levantar esta bandeira. O que está acontecendo neste curto período de déficit democrático, de um governo com nenhuma legitimidade, que implementa medidas que transformam completamente a Constituição Federal e o estado brasileiro, é de uma radicalidade que precisa ser revertida. O que eles estão fazendo é uma doutrina de choque, uma filosofia de poder, no qual você desconstrói tanta coisa ao mesmo tempo que tende a gerar uma capacidade pequena de reação pequena, já que são várias frentes de direitos atacadas numa velocidade muito grande. É um contexto em que a democracia não funciona.

Tendo isso em vista, é preciso, necessariamente, um movimento que venha de baixo para reconstruir e avançar em uma democracia verdadeira, com a reconstrução de alguns mecanismos de atuação do estado.
(MST/ Portal Vermelho)

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