As lágrimas da aniversariante

A aniversariante acordou debulhada em lágrimas, transparecendo muita tristeza e preocupação com seu futuro. Tristeza porque deve estar se perguntando que fez de mal aos que delegou o poder de administrá-la para tratarem-na de forma tão; e preocupação porque vê cada vez mais presente a possibilidade de chegar ao invejável status de quatrocentona, que tem o mesmo significado que a chegada dos 15 anos às adolescentes, feia, suja e atormentada pela malvadeza que ora campeia em decorrência da omissão daqueles que dela deveriam cuidar.
De fato, só não está pior porque uma ajuda vinda lá de longe evita que mais filhos seus vivam um flagelo tão deplorável quanto ao verificado na degradante situação daqueles deserdados que habitavam um vão inferior do complexo viário do Entroncamento durante esses quase dois anos de maquiagem retocada, só sendo retirados de lá às vésperas da efeméride de hoje, que parece desgostar profundamente a homenageada pelo seu caráter de 'limpeza social'.
Há cerca de um ano, quando 'esses' venturosos foram prometidos pelos que assumiram o desafio de cuidar da aniversariante de hoje e negligenciam nas suas tarefas, restou um que sequer foi referido, embora estivesse sempre presente: o 's' de sofrimento, marca registrada de nove anos em que filhos da homenageada dormem e acordam sob lama; veem entes queridos seus desaparecerem porque os espaços para a cura dos seus males estão precarizados a ponto de colocar todos em situação de risco; que veem, ainda, um dos mais singelos direitos que possui- o de ir e vir- transformar-se em tormento porque os 'cuidadores' permitem que esse transporte seja feito em condições tão degradantes. Paciência. Resta a esperança de saber que muitos outros aniversários virão. E sem a presença de gente tão despreparada no papel de comando da festa, pois há a certeza de que eles passarão e o futuro da bela Belém certamente passarinhará.