A saúde no Brasil tem sido tema de grandes debates nas últimas
semanas, provocados tanto pelas manifestações das ruas, que exigem
melhoras e mais investimentos na área, quanto pelas propostas recentes
do governo em trazer médicos de outros países para trabalhar em regiões
mais carentes.
Essas propostas, assim como a obrigação dos
estudantes de universidades públicas em cumprir dois anos no Sistema
Único de Saúde (SUS), tem sido alvo de fortes críticas das associações
de médicos, que afirmam que essas não seriam as soluções para os
problemas.
A Página do MST conversou sobre o tema com Augusto
César e Andreia Campigotto, ambos militantes do movimento e formados em
medicina em Cuba.
Nascido em Chapecó (SC) e com 25 anos de vida,
Augusto César ainda não exerce a profissão. Está estudando para fazer a
prova de revalidação do diploma cubano e, assim, poder atuar no Brasil.
Quando conseguir seu registro, pretende trabalhar na área rural,
atendendo os Sem Terra e os assentados da Reforma Agrária.
Andreia
Campigotto tem 28 anos e nasceu em Nova Ronda Alta (RS). Trabalha em
Cajazeiras, no sertão paraibano, como residente em medicina da família
em uma unidade básica de saúde, que atende uma comunidade de 4 mil
pessoas.
Formato
O curso de medicina
cubano dura seis anos. Para estudantes de outros países, ele se inicia
na Escola Latinoamericana de Medicina, localizada em Havana. Depois de
um período inicial de dois anos, os estudantes são enviados para as
diversas universidades do país. Augusto e Andreia foram para a
universidade da província de Camaguey.
O curso de medicina cubano não se difere muito do brasileiro, do ponto de vista curricular.
“Os
dois primeiros anos trabalham com as ciências médicas. Estudamos
fisiologia humana, anatomia humana e desde o primeiro ano temos contato
com os postos de saúde. Quando somos distribuídos para as universidades,
vivenciamos o sistema público de saúde. Comparado com o Brasil, o nível
teórico é igual, mas o nível de prática é maior", afirma Augusto.
“Um
estudo do governo federal mostra a compatibilidade curricular dos
cursos de medicina de 90% entre Brasil e Cuba. Então, não há grandes
diferenças teóricas", conta Andreia.
A diferença principal entre
os dois cursos está na concepção de medicina e de saúde na formação dos
médicos. “O curso brasileiro é voltado para as altas especialidades. Tem
essa lógica de que você faz medicina, entra numa residência e se
especializa. Já em Cuba o curso se volta à atenção primária de saúde,
para entendermos a lógica de prevenção das doenças e o tratamento das
enfermidades que as comunidades possam vir a ter”, diz Augusto.
Em
contrapartida, “saúde” e “medicina” no Brasil são sinônimos de pedidos
de exames e tratamento com diversos medicamentos, calcados em sua
maioria na alta tecnologia. Com isso, a medicina preventiva fica em
segundo plano, alimentando uma indústria baseada na exigência destes
procedimentos
“No Brasil, temos uma limitação na formação do
profissional, pois ela é voltada ao modelo hospitalacêntrico, que pensa
só na doença e no tratamento. Em Cuba isso já foi superado. Lá eles
formam profissionais para tratar e cuidar com qualidade, humanismo e
amor cada paciente; aprendemos de verdade a lidar com a saúde do ser
humano”, analisa Andreia.
Ela destaca que os médicos formados na
ilha são capazes de atender a população sem utilizar somente a alta
tecnologia, condição que não necessariamente limita um atendimento com
qualidade à população que mais carece.
“É mais barato fazer
promoção e prevenção de saúde. No entanto, isso rompe com a ditadura do
dinheiro. Com isso, os médicos aguardam o paciente ficar doente para
pedir um monte de exames e dar um monte de medicamentos”, afirma Augusto
De
acordo com ele, essa estrutura fortalece o complexo médico-industrial,
que se favorece sempre que há alguém internado ou que precise tomar
algum medicamento.
“Não negamos a necessidade de medicamentos e
equipamentos, porque precisamos dar atenção a esse tipo de paciente. Mas
não precisamos esperar que todas as pessoas fiquem doentes para começar
a trabalhar a questão da saúde”, acredita Augusto.
(MST/Brasil de Fato)
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