Jorge Paz Amorim

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Sou Jorge Amorim, Combatente contra a viralatice direitista que assola o país há quinhentos anos.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

Como um fazendeiro e um ativista fizeram o filme definitivo sobre o conflito Israel X Palestina

5 Câmeras Quebradas mostra como a convivência entre Israel e Palestina é impossível – e, ao mesmo tempo, fala de esperança, justiça e perseverança. Emad Burnat, um pequeno proprietário de terras em Bilin, ganhou uma filmadora meia-boca em 2005, quando nasceu seu quarto filho, Gibreel. No mesmo ano, colonos israelenses começaram a construir assentamentos na área, construindo uma cerca. Os invasores começam a tentar expulsar os habitantes. Destroem suas oliveiras, seu ganha-pão. Protestos passam a ocorrer semanalmente.
Emad registrou tudo: as bombas de gás lacrimogêneo, tiros de balas de borracha, prisões, atrocidades. No meio tempo, filmou o crescimento de Gibreel e suas reações diante daquele mundo.
Em 2007, uma corte israelense determinou a derrubada da cerca – o que só iria ocorrer quatro anos depois. Emad juntara centenas de horas de imagens. Seu amigo israelense Guy Davidi, cineasta, ativista e co-diretor do documentário, deu um fio condutor, escreveu a narração em off e sugeriu a abordagem: contar a história dos confrontos do ponto de vista de Emad, dividida em capítulos, cada um deles ilustrado pelo que as câmeras do palestino capturaram antes de ser destruídas.
Emad (centro) perde uma de suas câmeras depois de um disparo do exército israelense
Emad (centro) perde uma de suas câmeras depois de um disparo do exército israelense
O resultado é assombrosamente lindo e emocionante. Jornalismo cru, sem análise ou proselitismo, apenas a crônica de uma terra disputada por dois vizinhos – um armado de paus e pedras, outro de canhões, jipes, fuzis e granadas.
Emad Burnat nunca teve aulas de cinema. Não precisou. Além de uma habilidade inata e da intuição, ele foi para a linha de frente, desafiando a autoridade com sua filmadora e seu discurso de que era “jornalista” e tinha “autorização para trabalhar”. Não perde a convicção quando o exército passa a entrar na aldeia à noite e a prender crianças. Permanece ao lado dos dois amigos, o fanfarrão Adeeb e o grandalhão El-Phil, quando eles são detidos e, mais tarde, quando o pior acontece. Não recua na hora em que a mulher, Soraya, pede que ele largue tudo porque ela não aguenta mais viver com medo. (Soraya foi criada no Brasil e, a certa altura, fala em português com o marido. O próprio Emad passou um tempo aqui).
A visão filosófica do conflito faz com que Emad não perca a cabeça. Ele é posto em prisão domiciliar – e leva a câmera. Ele vê seu pai e sua mãe desesperados diante da detenção de seu irmão, tentando parar um jipe com o corpo. Ele testemunha um tiro à queima-roupa na perna de um manifestante que já estava dominado. É como se a câmera se o protegesse, ele diz (o que, naturalmente, não é verdade e tem suas consequências).
Numa situação tão sem saída, Emad não procura a aliança com terroristas ou faz um curso para virar homem bomba. Ao invés disso, a cada câmera destruída, ele adquire outra.  É o que dá sentido à sua vida. É a sua maneira de proteger sua vila e sua família.
5 Câmeras Quebradas ganhou vários prêmios e está indicado para o Oscar de documentário. Deveria ganhar. Deveria. Eu achava que o bonito Searching for Surgarman era imbatível, até assistir o que Emad e Davidi fizeram. Com simplicidade e poucos recursos, com talento, urgência e coragem, eles realizaram um épico. “Se você for ferido, vai sempre se lembrar da sua ferida, mesmo depois de ela se curar. Se você se machucar de novo e de novo… você esquece as suas cicatrizes”, diz Emad. “Mas a câmera se recorda, e então eu filmo para me curar”.
(Diário do Centro do Mundo)

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